domingo, 19 de outubro de 2008

Mészáros - pensador marxista

O húngaro István Mészáros, autor de "O Poder da Ideologia", "Para Além do Capital" e "A Teoria da Alienação”, é professor emérito da Universidade de Sussex (Reino Unido) e um dos principais pensadores marxistas da atualidade. A entrevista a seguir, concedida à repórter da Folha Fernanda Mena, em 2004, continua atual. Nela, Mészáros diz que é preciso haver uma reivindicação social do direito universal à educação.

Folha - Qual é a relação entre educação e pobreza?

István Mészáros - É a relação de um círculo vicioso. A pobreza impede as pessoas de se educarem e se desenvolverem. E, por outro lado, se as pessoas não participam e remodelam a sociedade, a pobreza e a exclusão continuam a crescer. Por muito tempo, ouvimos que a pobreza desapareceria gradualmente com o desenvolvimento do homem e da sociedade. Hoje, sabemos que isso é uma fantasia.Por conta desse círculo vicioso, o contrário está ocorrendo. Nos anos 60, havia 30 pobres na base da pirâmide socioeconômica para cada rico no topo dessa estrutura. Hoje, contamos 74 pobres para cada rico. No ano 2015, a previsão é que essa relação alcance cem pobres para cada rico no mundo. Essa é uma previsão oficial das Nações Unidas. Através da educação você pode tornar as pessoas capazes de contribuir para a solução de problemas da nossa sociedade, que tem muitos. Então dá para imaginar a tragédia que significa ter a maioria absoluta da população mundial hoje sem acesso ao menos à educação primária. Isso é muito irresponsável. Educação é algo absolutamente vital para o futuro.

Folha - A educação enquanto direito universal não tem sido respeitada por muitos Estados e, por outro lado, há uma tendência de comercialização do ensino. Como reverter esse processo?

Mészáros - Há essa tendência de tirar proveito material da educação, assim como de outras áreas, como a saúde. É preciso haver uma reivindicação social desse direito. Primeiro porque o Estado sozinho não financia estudo algum. O Estado é financiado com os recursos que a sociedade transfere a ele, e é desse dinheiro que tem de aumentar o investimento em educação. A educação privada, comercializada como serviço, só serve para comprar privilégios. E, no caso das universidades brasileiras [que cresceram mais de 116% durante o governo de Fernando Henrique Cardoso], tenho certeza de que elas não sobrevivem sem algum tipo de benefício do Estado, como isenções.

Folha - No que essa onda mercantilizadora da educação influi no conteúdo do ensino?

Mészáros - A nova escola está orientada para o mercado, para aquilo que se pode aprender para vencer. Essa orientação da educação é um canal para os propósitos expansionistas da produção de commodities. Expandir valores humanos, nesse sentido, se torna algo irrelevante, porque não gera lucro direto. O interesse hoje é de criar meios de expansão do capital. O que as pessoas aprendem para sua realização pessoal, os chamados valores úteis, tem cada vez mais sido compreendido como valores comerciais ou valores de troca. A grande reforma será redirecionar o conceito de valor útil para eliminar as condições miseráveis da humanidade hoje.

Folha - Depois da queda do muro de Berlim, Marx ainda tem valia quando se pensa a educação?

Mészáros - Claro que sim. Um de seus princípios, que permanece absolutamente válido ainda hoje diz que os educadores não estão acima das outras pessoas. Para Marx, os educadores também devem ser educados por serem parte de uma sociedade que sofre mudanças constantemente. Se não se educam os educadores de maneira contínua, eles se tornam inúteis. Essa contribuição de Marx é tão válida hoje como foi no passado, como também será no futuro. É uma regra, um princípio geral.

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